População acredia no chamado "jeitinho brasileiro". Especialistas afirmam que ele sequer existe.

Larissa Rodrigues
Monara Marques
Thaís Franco
Em setembro deste ano, o Indicador de Percepção de Corrupção divulgou a Finlândia como o país menos corrupto do mundo. Bem longe do primeiro colocado está o Brasil, que ocupa a 72ª posição. Mas, afinal, o brasileiro sabe o que é corrupção?
No Brasil, corrupção virou apenas sinônimo de roubalheira política. Indagada sobre o significado da palavra, a funcionária pública, Laurinda dos Santos, afirma ser “o que vem acontecendo no Senado brasileiro.” “Acho que dar dinheiro a um guarda não é corrupção, é suborno.” Porém, segundo o dicionário Aurélio, corrupção também é suborno, propina, nepotismo e extorsão, peculiaridades que a sociedade brasileira batizou de ”jeitinho brasileiro”.
Entretanto, para alguns especialistas, esse comportamento sequer existe. É o que explica a antropóloga Márcia Viana. Segundo ela, o jargão é na verdade um mito, uma forma depreciativa de caracterização que a sociedade assumiu e aceitou por ser um país de terceiro mundo. “Trata-se de algo que não existe, de uma construção social do capitalismo. A corrupção também é construída, é uma forma de vida onde o lucro é visado a qualquer custo.” Márcia também acrescenta que esse mito é uma herança colonialista.
O cientista político e antropólogo Wilson Ferreira concorda com Márcia Viana.“A corrupção no País está ligada a nossa colonização”. Para ele, desde o início do Brasil o povo acostumou-se a ver o Estado de forma privada e não como algo público. “Faz parte do senso comum, da natureza brasileira. Os cidadãos privatizaram a república e a utilizam para benefício próprio”.
Contrariando os especialistas, a população em geral crê e faz uso do “jeitinho brasileiro”. “Fazemos isso ao furarmos fila, ao colarmos na prova, ao andarmos na contra-mão, ao sairmos sem pagar, ao aceitarmos o troco errado, entre outros.” - afirma o estudante Ravy Delatorre. Para ele, usar do tal “jeitinho”, é a maneira mais fácil de conseguir as coisas, seja da forma correta ou não. O gerente financeiro João Daniel também acredita nessa idéia e enfatiza sua eficácia no País. “É por meio dessa atitude que a gente consegue as coisas com mais rapidez.”.
Mito ou não, esse comportamento é um dos maiores responsáveis pela vigência da corrupção no país. É o que afirma o deputado estadual do Partido dos Trabalhadores (PT), Humberto Aidar. Para ele, as pessoas criticam a corrupção, mas quando aparecem situações que as favorecem, elas aceitam de bom grado. “Se alguém oferecer às pessoas um cargo na Assembléia, onde elas terão apenas que receber, com certeza a maioria aceitará”, enfatiza. Humberto cita a Lei de Gérson para caracterizar o brasileiro. “Ela diz que a pessoa gosta de levar vantagem em tudo, no sentido negativo mesmo”.
A lei foi batizada com esse nome devido ao meia-armador da Seleção Brasileira de Futebol, Gérson. Ele sempre foi um jogador polêmico e protagonizou uma propaganda de cigarro que dizia que aquela marca era vantajosa por ser melhor e mais barata. No final, alfinetava: “Você também gosta de levar vantagem em tudo, certo?”
Mas tirar vantagem é uma exclusividade brasileira ou o mundo está cheio de “Gérsons”, tendo em vista que os critérios usados pela Transparência Internacional coincidem com vários dos comportamentos enquadrados no tal “jeitinho”? Para o cientista político Silvio Costa os Gérsons não são apenas “verde-amarelo”. “É o jeitinho americano, espanhol, italiano. Todo mundo quer levar vantagem.”
Exclusividade brasileira ou não, todos concordam que é preciso dar um basta nessa situação. Como afirma o deputado Humberto Aidar, haverá corruptos enquanto houver quem aceite ser corrompido. “Enquanto a malandragem e a esperteza forem sinônimos de qualidade, o ‘jeitinho brasileiro’ continuará imperando, a Lei de Gerson existindo e o país a cada dia será mais corrupto”, sentencia. Agora é decidir se “você gosta de levar vantagem em tudo” ou, como disse Charles Chaplin, prefere “ir à luta com determinação , perder com classe e vencer com ousadia”.